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Estratégias de ação docente

 

Luciana Bonato Lovato

Gladis Franck da Cunha

 

Os métodos de aprendizagem ativa, que são propostos ao longo deste livro serão mais bem aproveitados se forem organizados na forma de uma sequência didática compatível com a concepção de que o estudante deve ser o principal protagonista do processo de construção do conhecimento.

Segundo Kobashigawa et al (2008), uma sequência didática pode ser definida como um conjunto de atividades, estratégias e intervenções planejadas etapa por etapa pelo docente para que o entendimento do conteúdo ou tema proposto seja alcançado pelos estudantes, criando possibilidades para que, caso a construção do conhecimento não seja imediata, a mesma possa ocorrer no futuro. Para Amaral (2015), as sequências didáticas são um conjunto de atividades ligadas entre si, planejadas para ensinar um conteúdo, etapa por etapa. Nesse sentido, devem ser organizadas de acordo com os objetivos que o professor quer alcançar, envolvendo atividades de aprendizagem e de avaliação.

Ou seja, essa estratégia pode e deve ser usada em qualquer disciplina ou conteúdo, desde que se cumpram algumas etapas, comuns a um plano de aula, como objetivos, materiais a serem utilizados e instrumentos avaliativos, partindo do nível de conhecimento que os estudantes já dominam para chegar aos objetivos traçados pelo professor.

Há vários modelos de sequências didáticas criadas para projetos de aprendizagem ativa, dentre as quais podem-se destacar as Unidades de Ensino Potencialmente Significativas (UEPS) propostas por Moreira (2011), as quais, além de subsidiar o planejamento do professor, se caracterizam por buscar evidências da ocorrência de aprendizagem significativa. Dessa forma, uma UEPS, ao mesmo tempo em que permite ao professor organizar um planejamento de qualidade, também oferece a oportunidade de avaliar o trabalho ao longo do processo, de forma contínua, priorizando os aspectos qualitativos em detrimento dos quantitativos, como prevê a legislação (NUNCIO, 2016 e 2017).

Outro bom modelo de sequência didática são as Ilhas Interdisciplinares de Racionalidade (IIR) de Gerard Fourez (FOUREZ, 1997), cujo objetivo é promover nos estudantes uma Alfabetização Científica e Tecnológica (ACT), vindo ao encontro do que é defendido pelas Orientações Curriculares para o Ensino Médio (OCEM) (BRASIL, 2006). Assim sendo, por meio deste modelo de sequência didática é possível criar condições favoráveis para que os estudantes superem a visão das ciências, das tecnologias e da pesquisa investigativa como elementos separados uns dos outros e passem a vê-los de forma integrada. As IIR também podem contribuir para a ocorrência de uma aprendizagem significativa por parte dos estudantes (FERNANDES, 2017).

No presente capítulo, descreveremos os sete passos para elaboração de uma sequência didática a partir dos princípios propostos pelo Psicólogo, Pedagogo e Doutor em Ciências da Educação, Júlio César Furtado dos Santos (SANTOS, 2003)[1]. Uma vez que este método permite adotar estratégias que estão em conformidade com os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997), os quais enfatizam que cabe ao professor oportunizar situações que possibilitem aos estudantes do ensino fundamental questionar a realidade, formulando problemas e tratando de resolvê-los, utilizando para isso o pensamento lógico, a criatividade, a intuição, a capacidade de análise crítica, selecionando procedimentos e verificando sua adequação.  O que também é defendido pela Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2016) para o Ensino Fundamental, cuja área de Ciências da Natureza deve ter o compromisso com o desenvolvimento do letramento científico, que envolve a capacidade de compreender e interpretar o mundo (natural, social e tecnológico), mas também de transformá-lo com base nos aportes teóricos e processuais da ciência, ou seja os conteúdos curriculares devem ser trabalhados de forma a desenvolver nos estudantes a capacidade de atuação no mundo, fazendo escolhas e intervenções conscientes pautadas na sustentabilidade e no bem estar comum, desenvolvendo um novo olhar sobre o que os cerca.

Segundo Santos (2003), a concretização da aprendizagem se dá através dos sete passos da construção do conhecimento, que auxiliam o professor a definir suas ações frente à busca da aprendizagem.

1. O sentir – toda aprendizagem parte de um significado contextual e emocional.

2. O perceber – após contextualizar o estudante precisa ser levado a perceber as características específicas do que está sendo estudado.

3. O compreender – é quando se dá a construção do conceito, o que garante a possibilidade de utilização do conhecimento em diversos contextos.

4. O definir – significa esclarecer um conceito. O estudante deve definir com suas palavras, de forma que o conceito lhe seja claro.

5. O argumentar – após definir, o estudante precisa relacionar logicamente vários conceitos e isso ocorre através do texto falado, escrito, verbal e não verbal.

6. O discutir – nesse passo, o estudante deve formular uma cadeia de raciocínio através da argumentação.

7. O transformar – o sétimo e último passo da (re)construção do conhecimento é a transformação. O fim último da aprendizagem é a intervenção na realidade. Sem esse propósito, qualquer aprendizagem é inócua.

Baseando-se nessa ideia, a melhor estratégia para aprender Ciências é fazer ciência seguindo os passos dos cientistas, elencando problemas para encontrar soluções, através de práticas pedagógicas baseadas em experimentos que permitam a investigação, a construção e a reconstrução de saberes. O ensino deve estar dirigido para facilitar essas descobertas. O papel do professor é criar situações compatíveis com o nível de desenvolvimento cognitivo do estudante e este, exerce um papel ativo e constrói seu conhecimento, sob a orientação constante do professor nas atividades guiadas, como as propostas ao longo deste livro.

Além disso, ao oportunizar aulas que privilegiem a troca de saberes através dos conhecimentos prévios, análise crítica de materiais veiculados pela mídia relativos ao tema em estudo e práticas experimentais, se pode socializar as diferentes formas do conhecimento, desenvolvendo interações dialógicas com o professor e entre os grupos de estudantes. Neste contexto, a atividade experimental no ensino de Ciências é parte fundamental para que o processo de construção do conhecimento se efetive, o que ocorre quando os novos conhecimentos adquiridos se relacionam com o que o estudante já sabia.

Nesta proposta em que a aprendizagem está centrada no estudante e no aprender (e não no docente e no ensinar), sustentada pelos seus conhecimentos prévios e na disposição deste a aprender, o professor intervém com ferramentas, quando necessário, fornecendo subsídios para que os estudantes construam novos significados frente ao tema proposto, pois, segundo Freire (2005, p.47) “ensinar não é transferir conhecimentos, mas sim criar possibilidades ao estudante para a formação ou construção desse conhecimento”.

Gewandsznajer (2000) orienta que conhecer a ciência e aprender a usá-la para melhorar as condições de vida da humanidade é um ideal que todos nós, cientistas ou não, devemos perseguir. Ou seja, devemos integrar, de forma interdisciplinar o que se passa no mundo, mantendo o estudante atualizado em relação às inovações da sociedade e da ciência, de forma a fazer com que exista a compreensão da interação entre os conteúdos trabalhados nas diversas áreas do conhecimento e o meio em que está inserido.

Para Freire (2005), em sua expressão mais famosa, o professor deve interagir com o estudante não somente em conceitos curriculares, mas habilitá-lo a ler o mundo, ou seja, orientá-lo nos aspectos procedimentais e atitudinais, permitindo que ele aprenda a ler a realidade (conhecê-la) para em seguida poder reescrever essa realidade (transformá-la).

Antes de qualquer tentativa de discussão de técnicas, de materiais, de métodos para uma aula dinâmica assim, é preciso, indispensável mesmo, que o professor se ache “repousado” no saber de que a pedra fundamental é a curiosidade do ser humano. É ela que me faz perguntar, conhecer, atuar, mais perguntar, re-conhecer”. (FREIRE, 2005, p. 86).

 

Assim, este modelo de sequência didática, proposto aqui para atender o objetivo de desenvolvimento de uma Feira de Ciências, pressupõe que o papel do professor transcende os limites da sala de aula, pois ele deve orientar a busca por informações, promover a reflexão e a mobilização do estudante frente a temas que sejam relevantes e condizentes com a realidade que o cerca.

REFERÊNCIAS

AMARAL, H. Sequência didática e ensino de gêneros textuais. 2015. Disponível em: <https://www.escrevendoofuturo.org.br/conteudo/biblioteca/nossaspublicacoes/revista/artigos/artigo/1539/sequencia-didatica-e-ensino-de-generos-textuais>. Acesso em: 9 out. 2017.

FERNANDES, F. M. Ilhas interdisciplinares de racionalidade: uma proposta para o estudo da importância da água. Dissertação de Mestrado. Orientadora: Missell, Valquíria Villas Boas Gomes. Universidade de Caxias do Sul.  Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática, 2017. Disponível em:  https://repositorio.ucs.br/handle/11338/3121 Acesso em: 15 out. 2017.

FOUREZ, G. Alfabetización Científica y Tecnológica Acerca de la Enseñanza de las ciências. Buenos Aires. Argentina. Ediciones Colihue, 1997.

FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 2005.

GEWANDSZNAJER, F. Matéria e Energia. São Paulo: Ed. Ática, 2000.

KOBASHIGAWA, A.H.; ATHAYDE, B.A.C.; MATOS, K.F. de OLIVEIRA; CAMELO, M.H.; FALCONI, S. Estação ciência: formação de educadores para o ensino de ciências nas séries iniciais do ensino fundamental.  IV Seminário Nacional ABC na Educação Científica.  São Paulo, 2008.  p. 212-217. Disponível em: http://www.cienciamao.usp.br/dados/smm/_estacaocienciaformacaodeeducadorespaaoensinodecienciasnasseriesiniciaisdoensinofundamental.trabalho.pdf. Acesso em: 9 out.  2017.

MOREIRA, M. A. Teorias de aprendizagem. 2ª ed. ampliada. São Paulo: EPU, 2011.

NUNCIO, A. P. Contribuições de unidades de ensino potencialmente significativa (UEPS) para a disciplina de ciências do ensino fundamental.  Dissertação de Mestrado. Orientadora: Cunha, Gladis Franck da, Universidade de Caxias do Sul.  Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática, 2017. Disponível em: https://repositorio.ucs.br/handle/11338/1873 Acesso em: 15 out. 2017.

NUNCIO, A. P. Guia Didático para Aplicação de Contribuições de Unidades de Ensino Potencialmente Significativa (UEPS) para a Disciplina de Ciências do Ensino Fundamental. Revista Interdisciplinar de Ciência Aplicada - RICA UCS, ISSN 2525-3824, v. 2, n. 3, 2017. p. 40-123. Disponível em: http://www.ucs.br/etc/revistas/index.php/ricaucs/article/view/5239. Acesso em: 15 out. 2017.

SANTOS, J. C. F. O desafio de promover a aprendizagem significativa. 2003. Disponível em: http://www.unisul.br/wps/wcm/connect/a7c548f3-6254-4148-8b48-9fd0497b5ad4/desafio-aprendizagem-significativa_integracao-universitaria_extensao.pdf  Acesso em 29 mai. 2015.

 



[1] Este método foi utilizado para o desenvolvimento de uma sequência didática sobre a água para o 6º ano do Ensino Fundamental, na dissertação intitulada “A construção do conhecimento sobre a água por meio de uma sequência didática que emprega a estratégia de experimentação” de Luciana Bonato Lovato, que será defendida em novembro de 2017 e disponibilizada na página do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática: https://www.ucs.br/site/pos-graduacao/formacao-stricto-sensu/ensino-de-ciencias-e-matematica/dissertacoes/